NOTÍCIAS

documentos revelam arquivamentos para maquiar produtividade de juízes da Paraíba

O Conversa Política teve acesso a documentos da investigação do Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB) contra juízes acusados de maquiar processos para aumentar a produtividade.

O objetivo final era melhorar a pontuação usada como critério para escolha de desembargador.

Por causa das suspeitas de fraude, o edital para escolha de novo desembargador foi suspenso e as promoções paralisadas. A informação foi confirmada pelo blog, na última sexta-feira (18).

Nos documentos obtidos pelo Conversa Política, processos são arquivados dias ou horas depois abertos. Em um deles, o processo foi distribuído no dia 21 de fevereiro de 2025 e três dias depois foi arquivado.

De acordo com que apurou o blog, o tempo médio de um processo de abertura e seu arquivamento é de cerca de quatro anos, após trânsito em julgado. O que não aconteceu nos processos analisados.

“Objetivo de diminuir os tempos médios processuais de tramitação desde a distribuição até a sentença e desde a sentença até o arquivamento (art. 8º, II, “b” e “e” da resolução 15/2023), além de inflar uma sentença de acordo/homologação que jamais existiu e número de baixas”, registra um dos documentos da investigação obtidos pelo Conversa Política.

Nesses casos, os advogados das partes até poderiam pedir a reabertura do processo, mas o arquivamento inicial já é contabilizado para o magistrado da ação, gerando pontuações maiores para as futuras promoções.

Para piorar o efeito da ação, a manobra aumenta ainda mais a percepção de morosidade da justiça, visto que há o tempo do “desarquivamento”, com prejuízo para as partes.

A denúncia é a de que isso tem acontecido em centenas de processos.

Em outro documento, destacado abaixo, registra-se outra baixa artificial do processo no mesmo dia em que começou, com concessão de justiça gratuita. Um dos casos mais emblemáticos:

“Tanto o tempo médio processual desde a distribuição até a sentença (art. 8º, II, “b”, da Resolução 15/2023), bem como o tempo médio processual da sentença até o arquivamento (art. 8º, II, “e”, da Resolução 15/2023), são baixados artificialmente em face da introdução das referidas movimentações no mesmo dia, contaminando os seus dados e os do seu grupo de competência. Além disso, aufere uma média de sentença que não existe e abaixa artificialmente o seu acervo ativo”.

Nesse caso, o arquivamento foi imediato, sem abertura de tempo para recurso.

“A prática se concentra notadamente em processos distribuídos mais recentemente, sobretudo após despachos iniciais”, diz trecho do documento.

Prejuízos para imagem do judiciário

No início de abril deste ano, após despacho do presidente do Tribunal de Justiça da Paraíba, desembargador Fred Coutinho, feito no dia 25 de março, a Corregedoria-geral da Corte iniciou apuração dessas possíveis manipulações processuais envolvendo juízes candidatos à promoção para o cargo.

O prazo inicial para finalização era de 30 dias, mas foi adiado e ainda não foi finalizado completamente.

O tempo ampliado para prestação de contas sobre as supostas “maquiagens” e o silêncio longo sobre o conteúdo só aumentam as especulações sobre o tema e prejudicam a imagem de juízes e do judiciário paraibano.

Corregedor vai entregar relatório

O Conversa Política entrou em contato com o corregedor para questionar sobre a finalização da apuração.

O desembargador Leandro dos Santos afirmou que o relatório de inspeção já foi entregue à presidência do TJ, mas uma comissão técnica será formada para emitir um novo parecer e só depois disso, volta à Corregedoria para entrega de um relatório final consolidado. Segundo ele, o prazo será de pelo menos mais 40 dias.

O presidente do TJPB, Fred Coutinho, afirmou ao blog, na última quinta-feira (17), que a apuração da Corregedoria ainda está acontecendo e em breve será “feito o relatório final”.

Enquanto não sai o resultado, muitos vão para “régua dos suspeitos” e, nos bastidores, rondam as especulações sobre os envolvidos.

Denúncia feita por outro desembargador

A denúncia foi feita pelo desembargador Aluizio Bezerra Filho, no fim de março deste ano, em sessão pública do TJPB.

No requerimento com pedido de investigação, foi relatado que houve o arquivamento de processos ainda em fase inicial ou intermediária, sem decisão com trânsito em julgado — condição essencial, de acordo com o Manual de Gestão Documental do CNJ.

Mesmo sem a conclusão legal, esses casos teriam sido registrados como arquivados no sistema, elevando artificialmente a produtividade dos magistrados.

“Essa estratagema astuciosa projeta um ilusionismo de alta performance de produtividade formal, cujos números não contêm substância nem veracidade na sua essência”, disse Aluízio Bezerra na denúncia.

Remessa de processos sem voto pronto

Foi relatado ainda que uma das irregularidades apontadas é a remessa de processos sem voto pronto para as secretarias das Turmas Recursais. Na prática, criaria-se uma falsa impressão de que os gabinetes dos juízes estão com a carga processual em dia.

“Cuida-se de uma ‘maquiagem’ que ilude a realidade processual do gabinete do juiz, e proporciona vantagem indevida na apuração da produtividade para fins de promoção e remoção por merecimento”, afirmou o desembargador Aluízio Bezerra que fez a denúncia à época.

Segundo requerimento, sem os votos prontos, os processos não podem ser julgados, o que compromete a integridade do fluxo processual e dos dados registrados.

Além disso, a Corregedoria também apura outras movimentações consideradas incompatíveis, como a utilização do tipo “sentença” para registrar simples despachos, a homologação de atos sem decisões correspondentes, e a realização de audiências sem intimação das partes.

Risco de contaminação no processo de promoção

O desembargador solicitou que, caso se confirmem irregularidades, os dados inflados sejam desconsiderados da avaliação de produtividade dos candidatos, e que o resultado do processo de promoção não seja contaminado por informações distorcidas.

“São informações e informes que merecem investigação na sua inteireza e profundidade, em defesa do respeito e da credibilidade deste Poder”, destacou.